MAQUETES: SEU USO NA CONSTRUÇÃO DO ARQUITETO E NA CONSTRUÇÃO DA ARQUITETURA SCALE MODELS: ITS USE IN THE CONSTRUCTION OF THE ARCHITECT AND IN THE CONSTRUCTION OF THE ARCHITECTURE





CASTRO, Daiane Henrique de[1]




Resumo


Este paper tem como objetivo apresentar uma análise sobre o emprego de maquetes na arquitetura desde a formação do arquiteto até a execução de um projeto. Para isso foi feito uma revisão dos textos publicados por Arthur Rozestraten e Paulo Yassuhide Fujioka citados na bibliografia específica. Enquanto Rozestraten foca seu estudo nos primórdios do uso dos modelos e maquetes na história da arquitetura grega e posteriormente a romana, Fujioka relata sua experiência com estágio em anos iniciais na FAUUSP citando a importância observada do uso de maquetes desde o inicio da graduação como ferramenta de aprendizado da História e Teoria da Arquitetura.

Palavras-chave: maquetes; modelos; metodologia de ensino; história da arquitetura; processo criativo.

Abstract


This paper aims to present an analysis on the use of scale models in architecture from the formation of the architect to the execution of a project. For this was done a revision of the texts published by Arthur Rozestraten and Paulo Yassuhide Fujioka cited in the specific bibliography. While Rozestraten focuses his study on the beginnings of the use of scale models and mockups in the history of Greek architecture and later Roman, Fujioka reports his experience with internship in early years in FAUUSP citing the observed importance of the use of models From the beginning of the graduation as a tool for learning history and theory of architecture.

Key-word: Scale models; models; teaching methodology; history of architecture; creative process.

INTRODUÇÃO


Primeiramente é necessário definir o que são maquetes no campo da Arquitetura, e para Fontes, Abdalla e Longo (2009), “[...] são formas de representação gráfica tridimensional de modelos utilizadas com o intuito de se representar fisicamente ou virtualmente um objeto, um edifício ou uma cidade como exemplo.” Partindo dessa ideia iniciamos nossa análise sobre o desenvolvimento da maquete no processo de construção do arquiteto e da arquitetura, observando a importância de seu uso durante a graduação como parte do processo de aprendizado. Segundo Fujioka (2005) “Os artefatos tridimensionais destacam características dos edifícios que passam despercebidos pelos alunos nas aulas expositivas [...]” demonstrando que a confecção de maquetes é um excelente aliado às aulas de História da Arquitetura, porque proporcionam aos alunos um entendimento que passa despercebido quando apenas se observa imagens. A tridimensionalidade deve fazer parte do processo de criação do arquiteto desde seus anos iniciais na graduação. Para Fujimoto (2009) “[...] as maquetes atuam como mecanismos de pensamento e originam novas ideias.” Sendo assim é essencial o seu uso durante a concepção do projeto.

Sabendo que seu uso não se restringe ao processo de criação do arquiteto, mas também de sua obra, Rozestraten (2008) baseou seu estudo nos escritos de Heródoto (484-420 a.C), Aristóteles (384-322 a.C) e Vitrúvio (80-15 aC), em uma busca por entendimento sobre o inicio de uso de maquetes como ferramenta projetual.

Os datados antigos demonstram equívocos quanto a traduções de palavras com o intuito de expressar a ideia de modelos em escala, Rozestraten apresenta posições de diferentes autores sobre a existência de maquetes na Grécia antiga, o uso de modelos no mundo romano e faz um paralelo com as maquetes de estudo de Brunelleschi (1377-1446), remetendo a importância desses modelos desde a idade antiga.

As maquetes interessam, principalmente, por sua função de concepção e representação de uma obra, servindo ao mesmo tempo como cristalização de um pensamento e antecipação de uma realidade construtiva. Construído em escala reduzida, o edificio se expõe pela primeira vez ao juízo público. (BASSO,2005,p.48.)

MÉTODOS


Para obtenção dos dados aqui apresentados foram escolhidos textos acadêmicos e publicações em periódicos como forma de obtenção de material para análise do tema proposto. A revisão de leitura serviu de base para iniciar o debate sobre a importância do uso de maquetes desde a Grécia antiga na confecção de suas construções até os dias atuais como parte do processo de criação tanto do arquiteto quando da arquitetura.

REVISÃO DE LITERATURA


Segundo Rozestraten (2008) “[...] a mais antiga referência da literatura grega a um modelo arquitetônico tenha sido feita por Heródoto [...]” fazendo relação a construção do Templo de Delfos. Em seu texto ao citar Heródoto ele relata: “[...] eles construíram o templo ainda mais belo do que previa seu modelo (paradeigmatos).” A tradução da palavra paradeigma demonstrou uma possível tradução equivocada quando seu uso poderia remeter a templos construídos anteriormente a de Delfos dado que:

 “[...] toda história da arquitetura clássica grega pode ser vista como uma história de contínuos e lentos aprimoramentos de padrões, modelos e convenções. [...] A partir dessas considerações, é possível interpretar o paradeigma de Heródoto como modelo ideal, exemplo, padrão, ou seja, referência arquitetônica de templo.” (ROZESTRATEN, 2008,P.146)

Não se pode interpretar no texto de Heródoto o uso de modelos em tamanhos reduzidos como os utilizados no dias atuais, dado que afirma Rozestraten (2008): “[...] os desenhos em planta e elevação em escala reduzida [...] não deixaram vestígios materiais no mundo grego. Não há sequer vestígios arqueológicos de instrumentos de desenho gregos.” Existem três linhas de raciocínio que norteiam o estudo sobre o tema.

São elas:

Tabela 1-Linhas de Raciocínio quanto o papel do desenho na atividade dos arquitetos gregos

AUTORES
ANO
LINHA DE RACIOCÍNIO
Bundgaard
1977
Defende a ideia de que arquitetos gregos não utilizavam desenhos em escala reduzida
Coulton
1977,1983,1985
Defende a ideia de desenvolverem desenhos preliminares incompletos e quando necessário completados em obra
Dinsmoor
1985
Defende a ideia de uso de desenhos detalhados.

FONTE: Rozestraten (2008, p.146)


A hipótese de Coulton é a que mantém maior respaldo científico, sendo ela apoiada na existência de memoriais descritivos denominados Syngraphé. Esses deveriam ser completados por paradeigmas ou typos caso fosse necessário. “Paradeigma e Týpos são os prováveis modelos tridimensionais dos arquitetos da Grécia clássica [...]” Rozestraten (2008).  A ideia de que essas palavras foram traduzidas de forma equivocada nos levam a entender que não existiu nesse momento o uso de maquetes da forma que conhecemos hoje.

Quanto ao mundo romano existem comprovações vindas de materiais arqueológicos e literaturas mostrando o uso de modelos tridimensionais. Vitrúvio apresentou considerações sobre esses modelos em seus livros. Quando Rozestraten (2008) cita Vitrúvio (1971) ele exemplifica de forma muito clara o uso de um modelo feito por Cálias, arquiteto fenício.

“Nesse tempo, chegando a Rodes um certo Cálias, arquiteto oriundo de Arado (na Fenícia), pronunciou uma conferência e apresentou um modelo de fortificação sobre o qual instalou uma máquina com gávea giratória, com a qual agarrou uma helépole (arrebatadora de cidades) e a introduziu dentro das muralhas. Ao ver tal modelo, os habitantes de Rodes, admirados, retiraram a pensão dada anualmente a Diogneto e transferiram-na em favor de Cálias.” (POLIÃO, 1999, p. 243)

Cálias recusou o pedido de execução de seu projeto quando foi solicitado, segundo Rozestraten (2008) o modelo de Cálias não era viável em escala real, porque seu modelo não compreendia os estudos de esforços necessários para sua execução. Em contrapartida a execução de um modelo baseado em estudos fora feito por Brunelleschi anos depois no Renascimento.  

O estudo da cúpula de Santa Maria Del Fiori em Florença executado por Brunelleschi datou a conquista da modelagem tridimensional.

Registra-se, então, no Quattrocento, não só a conquista da perspectiva como instrumento para o conhecimento do mundo, mas também a conquista da modelagem tridimensional como instrumento para tal conhecimento, de forma nitidamente diferente de como era usada na Antiguidade, e mesmo na Idade Média. (ROZESTRATEN, 2008, p.155)



Já a analise de Fujioka (2005) nos mostra através de sua experiência como estagiário nos anos iniciais da faculdade de arquitetura e urbanismo o quanto o uso de maquetes é enriquecedor para o desenvolvimento do futuro arquiteto. Seu uso em aulas de História da Arquitetura potencializam o aprendizado principalmente por colocar o graduando em posição de criação ao confeccionar o modelo, fazendo com que logo nos primeiros semestres a visão espacial do aluno seja desenvolvida.

Citando  Katinsky (1995), Fujioka (2005) nos leva a valorizar a importância da História da Arquitetura:

“[...] como um instrumento para compreender o presente e, se possível, antecipar certos encaminhamentos previsíveis do desenvolvimento social e artístico. Uma história assim concebida não pode deixar de ser crítica em relação fatos e o patrimônio intelectual herdado [...] a História da Arte e da Arquitetura não só afeta permanentemente os objetos pesquisados, mas altera o pesquisador. Como o exercício da própria Arte, ou seja, a História da Arquitetura pode ser entendida como uma construção do objeto de investigação, ao mesmo tempo que se constrói o sujeito que investiga.” (KATINSKY, 1995,p. 120-121)


O estudo da história faz com que o futuro arquiteto obtenha conhecimento suficiente para entender os processos construtivos existentes para que a partir da saturação de todas as possibilidades possa iniciar um processo de criação envolvendo um desapego das práticas existentes. Fujioka (2005) relata que “A originalidade e qualidade de projeto de um mestre revolucionário quase sempre está embasada no conhecimento firme do cânone. E a rejeição da tradição, com segurança e firmeza, só pode ocorrer quando já se domina a prática tradicional.”

O uso de maquetes para o estudo da arquitetura existente tem sido empregado nas disciplinas  de História e Teoria da Arquitetura para entendimento dos processos construtivos e projetos arquitetônicos, Fujioka (2005) conta que em seu estágio presenciou o desenvolvimento de um projeto dos alunos do primeiro semestre do curso de Arquitetura e Urbanismo na FAUUSP em que se resumia a uma visita ao centro da cidade de São Paulo contemplando a Rua Líbero Badaró, Praça Antônio Prado, Vale do Anhangabaú, Viaduto do Chá, Rua Marconi, Rua Barão de Itapetininga e Praça da República; exercícios de desenho, seminários e confecção de maquetes.

A confecção de maquetes proporciona uma observação minuciosa sobre os detalhes que certamente passam despercebidos em fotografias ou slides, fazendo com que o aluno tome parte do processo de criação da edificação escolhida.

“Se a maquete é um instrumento valioso na prática de projeto, a construção da maquete de determinada obra possibilita ao aluno refletir a resposta do arquiteto a um programa e sítio; e as características de partido, estrutura, aberturas, fechamentos, acessos, circulação, articulação de volumes, iluminação e ventilação natural, sentido de ordem e proporção – ou seja, o projeto como um diálogo formal entre a construção e o meio ambiente, o entorno natural e o construído”. (FUJIOKA,2005, p.56)



Fujioka (2005) ao final de seu estagio chega a conclusão que a formação do graduando de arquitetura pode ser otimizada se houver o acréscimo de algumas atividades relacionadas a confecção de maquetes:

Tabela 2- Sugestões para inserção de modelagem tridimensional nas FAUs

Sugestão
Execução
Construção de acervo-museu de maquetes
Construído a partir de modelos confeccionados por alunos com notável qualidade de execução
Seminários sobre maquetes no início do curso
Ministrado por alunos da turma do ano anterior
Criação de apostila-manual
Confecção de apostila sobre técnicas, escalas e materiais empregados na confecção de maquetes





FONTE: Fujioka (2005,p.58)

RESULTADOS


De acordo com Basso (2008) “[...] o uso simultâneo e o complementar dos dois principais tipos de representação – desenho e modelo, permite ao arquiteto controlar efetivamente o seu projeto.” Logo, o uso da maquete torna-se parte do processo de criação e representação do projeto, o estudo de Rozestraten (2008) demonstrou a importância do uso de modelos na antiguidade, enquanto a experiência de Fujioka (2005) nos leva a perceber o quanto a confecção do modelo se torna indispensável para o crescimento do arquiteto.

O inicio do estudo de arquitetura deve vir acompanhado por uma visão espacial do desenho, um entendimento do espaço e uma noção da execução do projeto; é certo que a construção de modelos tridimensionais permitem que o graduando obtenha esse conhecimento, otimizando o aprendizado e a compreensão de outras disciplinas. O uso desses modelos para que o aluno compreenda a história da arquitetura também demonstra uma notável forma de percepção espacial.  Bruno Zevi (1919-2000) é citado por Fujioka (2005) quando relata a deficiência da compreensão da arquitetura através de fotografia e através do cinema e mesmo que de forma ainda incompleta a maquete apresenta uma melhor forma de apresentação de um projeto arquitetônico. Para ele, Zevi (1979), a única forma de percepção que traga veracidade seria andar pela obra. Certamente a evolução da computação gráfica trouxe incontáveis benefícios para a representação da arquitetura, um passeio virtual tão facilmente acessado através de óculos de realidade virtual onde é possível visualizar uma modelagem em três dimensões, passear através do projeto e obter a experiência de estar presente no local antes mesmo deste ser executado trouxe melhorias significativas para a apresentação do projeto para o cliente final. No entanto ainda não foi criado uma melhor forma que enriqueça o arquiteto em sua formação ou mesmo em seu processo de criação como a maquete de estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


Através do estudo apresentado, pode-se chegar a algumas conclusões do quanto o uso de maquetes é vital para a arquitetura.

Iniciando em Aristóteles e chegando aos dias atuais nas universidades de arquitetura, a modelagem tridimensional demonstrou grande valia para o arquiteto, seja como forma de representação de sua ideia ou parte de seu crescimento como profissional durante a graduação.

Certamente as maquetes de Brunelleschi no Renascimento retratam mais fielmente o projeto e seu desenvolvimento de construção como é feito nos dias atuais, no entanto não se pode diminuir a importância dos modelos como de Cálias no processo de evolução da história das maquetes. A partir de modelos como de Cálias e Da Vinci foi possível pensar em uma forma mais verosímil de representação e estudo do projeto. Da mesma forma a sequência de evolução passa pelo processo de construção de um arquiteto, fazendo com que a confecção de modelos por graduandos aprimore sua visão espacial.

O aparecimento de novas ferramentas de representação gráfica certamente agregam benefícios ao profissional de arquitetura quando se trata da apresentação para clientes, mas o processo de criação dificilmente descartará a concepção da maquete física.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA




ABDALLA, José Gustavo Francis; LONGO, Orlando Celso; FONTES, Ramon Ribeiro. A importância das ferramentas de representação gráfica no processo de concepção do projeto Arquitetônico. IV Projetar, São Paulo, out 2009.



BASSO, Ana Carolina Formigoni. A idéia do modelo tridimensional em arquitetura. 2005. Dissertação (Mestrado em Tecnologia do Ambiente Construído) - Escola de Engenharia de São Carlos, University of São Paulo, São Carlos, 2005.



FUJIOKA, Paulo Yassuhide. Maquetes no ensino de história da arquitetura: experiências de estágio de ensino da FAUUSP. Revista Pós, n.17, São Paulo, dez 2005. Pp 046-061.



PEDRO, Marta. Sou Fujimoto. Arte Capital, 2009. Disponível em <www.artecapital.net/arq_des-55-sou-fujimoto>. Acesso em: 21 abr. 2018, 15:23:00.



ROZESTRATEN, Artur. Comentários sobre a modelagem tridimensional na arquitetura grega e romana antigas: Heródoto, Aristóteles e Vitrúvio. Revista Pós, n.22, São Paulo, dez 2008. pp142-159.



[1] Acadêmica do curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Anhembi Morumbi, email daiane_chs@hotmail.com –. Sob a orientação da Profª Drª Arq. Tânia Miotto na disciplina “Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo: Antiguidade ao século XVIII”.

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas