VIAGEM NO TEMPO: TEATRO MUNICIPAL



Fachada Teatro Municipal de São Paulo


Amor por música clássica aliado ao amor pela arquitetura certamente me levaria a esta imponente construção em São Paulo, o ar que se respira nesse lugar faz com que nos sintamos retornando no tempo em pelo menos um século.

Tive a imensa alegria de ser acordada no dia 03/04 com um e-mail me dizendo que eu ganhara um par de ingressos para o concerto regido pelo maestro João Carlos Martins no Teatro Municipal de São Paulo que aconteceria nesse mesmo dia. A alegria foi tamanha que não conseguia pensar em nada mais, só em ver a regência do maestro que em minha infância, fez minha paixão por música clássica aflorar.

Estar novamente naquele teatro magnifico, mas dessa vez no período noturno fez meu coração bater mais forte. As luzes que compõe o cenário externo, a magia do lugar e toda a magnitude são incrivelmente diferentes quando estão sob o sol e sob o luar, vale visita-lo nos dois momentos sem sombra de dúvidas.

Fachada frontal


Ao chegarmos no teatro podemos nos deliciar com a arquitetura, esculturas e obras de arte que estão por todo o lugar. Nos dirigimos aos nossos assentos e aquelas cadeiras de madeira com tecido vermelho parecem nos envolver com arte.

Vista das cadeiras do camarote


No palco começaram as apresentações previas a regência do maestro João Carlos Martins ,mas nem por isso foram de menor qualidade ou valor, as apresentações foram de emocionar até o mais duro coração. 

Palco na noite do concerto

Chegando então o momento da entrada do maestro os aplausos encheram aquela sala que possui acústica perfeita e então ele apresentou em seu piano uma obra de Bach que nos tirou o folego, ao vê-lo com todo amor a musica e ao piano era inevitável o rolar de lagrimas. Em uma conversa posterior ele me disse que a dor que sente em suas mãos quando toca o piano infelizmente é ainda maior que no principio de sua doença tornando extremamente dolorosa a ação de tocar, talvez por isso fora tão impactante vê-lo ali.
Após sua apresentação no piano ele regeu a “Orquestra Bachiana Filarmônica SESI- São Paulo” e assim a noite se completou lindamente. Sem nenhuma partitura em sua frente, com todos os movimentos gravados em sua alma ele regeu, e nos levou ao êxtase com toda intensidade e força de sua presença. É algo que eu aconselho acrescentar a sua lista de coisas para fazer antes de morrer. Para conhecer um pouco mais da história do maestro recomendo assistir ao filme “João, o maestro”.
As pessoas costumam dizer que musica clássica foge ao gosto da população brasileira. Quero só deixar um parênteses nessa conversa: Havia mais de quatro mil pessoas esperando para entrar no teatro e acabaram não conseguindo ingresso. Foi uma noite memorável!


Multidão no entorno do teatro esperando conseguir ingressos

Um outro dia desses fiz uma visita guiada pelo teatro. É possível conhecer a fascinante história de sua construção e observar os detalhes majestosos que ele possui, os monitores são muito prestativos e muito bem preparados para responder qualquer duvida que surja no decorrer do trajeto. Já a visita noturna para assistir um concerto é cercada de glamour e paixão, o teatro se enche de pessoas interessadas em fotografar, fazer check-in em redes sociais e por algumas horas se sentir parte de uma pequena parcela privilegiada da sociedade paulistana.

Digo isso remetendo a origem do teatro que se deu justamente com esse objetivo, mostrar que a sociedade paulistana a partir daquele momento era culta, cheia de glamour e elitizada tanto quanto a sociedade europeia que ela tanto queriam se igualar.
Teatro municipal em 1914 foto de Aurelio Becherini

Como a maior vontade de ter um local para demonstrar poder e riqueza era dos barões de café, a construção foi feita pela iniciativa desse grupo, especificamente três barões de café que receberam isenção total de impostos por 50 anos.

O prédio começou a ser construído em 1903 mas a conclusão e a inauguração aconteceu em 12 de setembro de 1911.

Operários que trabalharam na construção do Theatro Municipal posam para foto em 1911
( Acervo Theatro Municipal)



 Como muitas obras desse período na cidade de São Paulo o teatro foi construído pelo Escritório Ramos de Azevedo e teve a colaboração de Claudio e Domiziano Rossi, que se inspiraram na ópera Garnier localizada em Paris. É interessante também saber que muito dos materiais utilizados vieram prontos da Europa, um exemplo é a escadaria do saguão que veio da Italia e foi feita com três tipos de mármore italiano (carrara, verona e siena), mostrando bem que a ideia era se aproximar ainda mais dos padrões europeus. O estilo do teatro é considerado eclético já que é possível encontrar art noveu, barroco, renascimento e neo clássico.

Ramos de Azevedo, Domiciano Rossi e Claudio Rossi 1911
( Ilustração Paulista)

Por todo o teatro existem simbologias atreladas a mitologia grega e ao produto mais importante da época: o café. Engana-se quem pensa que o teatro é apenas uma sala de espetáculos, o prédio é composto de várias salas e afins. Para ser justo ao analisar o local é preciso nunca esquecer o ano que ele foi feito, traçar um paralelo com os acontecimentos históricos da época e assim entender o porque de cada um dos diversos locais do teatro.

Viaduto do chá em 1892, com o Vale do Anhangabaú cortado pelo viaduto. No fundo, no centro, o terreno onde será construído o Teatro  (fotografo desconhecido)


As peças de ópera duravam horas e haviam as pausas durante o espetáculo, logo deveria existir locais para convivência.  O fumoir para mulheres é um belo exemplo do contexto histórico, do tempo que passavam dentro do teatro e a tipologia das diversas salas que ali existem, uma sala dentro do teatro localizado ao lado do salão nobre, destinada para que as moças da época fumassem, já que não era de bom tom que mulheres fumassem perto de homens. O salão nobre é outro local que exemplifica bem o que propunha o teatro municipal para a sociedade daquela época, ele era chamado de salão de festas porque de fato ocorriam festas da alta sociedade naquele local, incluindo bailes de carnaval, hoje por conta da preservação não há mais essa possibilidade, no entanto é possível aluga-lo para alguns eventos pequenos.
Porta de entrada para o salão nobre
(acervo próprio)

Teto salão nobre
(acervo próprio)


O salão de festas foi inspirado na galeria dos espelhos do Palácio de Versalles, são diversas referencias a mitologia grega e aos barões de café e confeccionados por materiais vindos do mundo todo. Uma curiosidade é que o piso é feito de peroba rosa e pau marfim que são madeiras nobres brasileiras e hoje estão em extinção, por isso foi solicitado aos Irmãos Campana ,que são brasileiros e referência em design no mundo, todo que confeccionasse um tapete que protegesse o piso.


Salão Nobre e o tapete confeccionado pelos Irmãos Campana
(Foto Ricardo Kleine)

A sala de espetáculos, que é a única no teatro, tem o palco em formato italiano com uma moldura feita em gesso pelo artista brasileiro Alfredo Sassi e logo a cima existe um medalhão com a figura do patrono do teatro: Carlos Gomes. O teto apresenta formas que otimizam o som proporcionando a acústica desejada, considerada a melhor sala para ópera no país, ali também existe um lustre que pesa uma tonelada e meia.


Palco (acervo próprio)

As laterais do palco são ocupadas por um órgão que foi divido em duas partes para ser posicionado dessa forma, ele possui 5.827 tubos e esse local anteriormente eram ocupados por camarotes que eram os mais importantes lugares, interessante o fato da visão para o palco ser extremamente prejudicada nesses locais, mas para a função de ser visto com a mais alta posição de destaque, era perfeito.

Órgão (divulgação)


Outra curiosidade que aprendi na visita guiada foi a respeito do conforto térmico, em baixo das cadeiras existem saídas de ar que direcionavam o ar frio vindo de fora para dentro da sala de espetáculo e o ar quente saia por cima. Lembrando que existiam ópera com 16 horas e não havia ar condicionado por isso o estudo de conforto térmico era imprescindível. Hoje após a reforma, a sala de espetáculos foi modernizada acrescentando ar condicionado além de maquinários para o palco para oferecer a maior qualidade nos espetáculos.

Um outro local que é possível conhecer através da visita guiada é o Salão dos arcos, inicialmente esse local que contem as fundações que sustentam o teatro serviam também como circulação de ar e os dutos levavam esse ar para as saídas a baixo das cadeiras como eu havia citado anteriormente. Outro uso desse espaço era chegar a um túnel abaixo da Rua Coronel Xavier de Toledo que conduzia os artistas diretamente a um hotel do outro lado da rua. O salão chama atenção pelo seu formato, seus diversos arcos cerâmicos e suas bases construídas de pedra assentadas com uma mistura de areia, calcário, conchas e gordura de baleia são inegavelmente uma atração a parte. Em 2017 iniciou-se o projeto da abertura do local para um bar de Jazz.

Salão dos Arcos
(Foto Ricardo Kleine)

Se tudo isso que foi dito ainda não te fazer querer sair correndo e ir visitar o teatro, lembre-se que ali também sediou a Semana da Arte Moderna de 1922, e andar pelos lugares que artistas tão incríveis e que mudaram a perspectiva da arte andaram já é motivo mais que válido para visitar o local.

Cartaz da Semana da Arte Moderna

Cartaz anunciando o ultimo dia da Semana da Arte Moderna





Para saber mais:

Sobre a visita guiada, programação e aluguel de espaços do Theatro Municipal: Theatro Municipal

Se você ficou morrendo de vontade de fazer uma visita e não pode vir a São Paulo o teatro através do Google oferecem um experiência interativa muito interessante: Visita a distância

Para saber a quantas andam e programação do bar no subsolo: Bar dos Arcos


Bibliografia

palestrarte.com.br/palestrante/maestro-joao-carlos-martins/

https://historiadesaopaulo.wordpress.com/teatro-municipal/

http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa441557/ramos-de-azevedo
https://www.portalsaofrancisco.com.br/historia-geral/teatro-municipal-de-sao-paulo

campanas.com.br/

https://catracalivre.com.br/sp/arquivo/indicacao/7-coisas-que-voce-nao-sabia-sobre-o-theatro-municipal-de-sp/

https://www.archdaily.com.br/br/886694/subterraneos-que-resguardam-parte-da-historia-de-sao-paulo





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